quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Os poemas de Outono que divulgámos

Se deste Outono
Se deste Outono, uma folha,
apenas uma, se desprendesse
da sua cabeleira ruiva,
sonolenta,
e sobre ela a mão
com o azul do ar escrevesse
um nome, somente um nome,
seria o mais aéreo
de quantos tem a terra,
a terra quente e tão avara

de alegria.
Eugénio de Andrade


Vozes de Outono
Ouve, tu, meu cansado coração,
O que te diz a voz da Natureza:
- "mais te valerá, nú e sem defesa,
Ter nascido em aspérrima solidão,

Tergemido, ainda infante, sobre o chão
Frio e cruel da mais cruel
deveza, Do que embalar-te a Fada da Beleza,
Como embalou, no berço da Ilusão!

Mais valera à tua alma visionária
Silenciosa e triste ter passado
Por entre o mundo hostil ea turba vária,

(Sem ver uma só flor, das mil, que
 amaste)
Com ódio e raiva e dor .... que ter sonhado
Os sonhos ideais que tusonhaste!"
Antero de Quental, in "Sonetos"

Outono
tarde pintada
Por não sei que pintor.
Nunca vi tanta cor
Tão colorida!
Se é de morte ou de vida,
Não é comigo.
Eu, simplesmente digo
Que há tanta fantasia
Neste dia,
Que o mundo me parece
Vestido por ciganas adivinhas, E que gosto de o ver, e me apetece
Ter folhas como as vinha.
Miguel Torga, in Diário X (1968)

Aguarela
Se o escuro da noite me entristece,
acorrentada a viperinas vozes,
espero confiante a luz de um guia.

De rosas me cobrir e de alegrias
foram sonhos pintados de inocência,
as cores de Outono o momento indiciam.

Voam leves as folhas amarelas
atapetando este cinzento dia,
retoques espraiadios na aguarela.
Manuela de Azevedo, in O Canto das Fragas

Outonalidades
Uma formiga move-se,
silenciosa,
num labirinto de folhas,
amarelas, castanhas, avermelhadas,
caídas de um plátano.
Um coelho esconde-se,
prudente,
numa serra matizada,
de verde branco lilás.

Estas imagens
aportam-nos à memória
o fim da vida.

Outono ou tonalidades?

Pintalgam, estas cores,
anossa existência
monocromática
fazendo-nos ver
a beleza rara
que há por descobrir
na natureza
 e no interior
...de cada um de nós.
José Amaral, in Outonalidades

Outono compareceu,
trazendo os seus dias curtos
 e um véu nocturno ansioso.
Mas, no entanto,
apalpo ainda em várias oliveiras
o canto de cigarras alheado
do tempo que chegou.
António Salvado, in Ao fundo da página

Outono
Outono vem em vulvas claridades...
Vamos os dois esp´rá-lo  de mãos dadas:
Tu, desfolhando as rosas das estradas,
E eu, escutando o choro das saudades...

Outono vem em doces suavidades...
E a cender fogueiras apagadas
Andam almas no céu, ajoelhadas...
E a terra reza a prece das Trindades.

Choram no bosque os musgos e os fetos.
Vogam nos lágos pálidos e quietos,
Como gôndolas dòiro, as borboletas.

Meu amor! Meu amor! Ontono vem...
Beija os meus olhos roxos, beija-os bem!
desfolha essas primeiras violetas!...
Florbela Espanca in Poesias: 1918-1930

Uma névoa de Outono o ar raro vela
(5-11-1932)
Uma névoa de Outono o ar raro vela,
Cores de meia-cor pairam no céu.
O que indistintamente se revela,
Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono.
Sim, sinto-o eu pelo coração, o como.
Mas entre mim e ver há um grande
Sono.
.

De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual,
mas se for outro, pirque é amanhã,
Terei outra verdade, universal,
E será como esta (...)
Fernnado Pessoa

Em uma tarde de Outono
Outono. Em frente ao mar. Escacnacaro as janelas
Sobre o jardim calado, e as ´´aguas miro, absorto.
Outono... Rodopiando, as folhas amarelas
Rolam, caem. Viuvez, velhice, desconforto...

Por que, belo navio, ao clarão das estrelas,
Visitaste este mar inabitado e morto,
Se logo, ao vri do vento, abriste ao vento as velas,
Se logo, ao vir do vento, abriste ao vento as velas,
Se logo, ao vir da luz, abandonaste o porto?
A água cantou. Rodeava, aos beijos, os teus flancos
A espuma, desmanchada em risco e flocos brancos...
Mas chegaste com a noite, e fugiste com o sol!

E eu olho o céu deserto, e vejo o oceano triste,
E contemplo o lugar por onde te sumiste,
Banhando no clarão nascente do arrebol...
Olavo Bilac, in "Poesias"

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